Na reta final da eleição presidencial, um tema passou a dominar a pauta: o reajuste "real" do salário mínimo. Mas o que é aumento real e quais as consequências de um reajuste maior ou menor do piso mínimo nacional?
O salário mínimo serve como referência para aposentadorias, pensões e outros benefícios pagos pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) e hoje está em R$ 1.212.
A Folha de S.Paulo revelou na semana passada um projeto do ministro Paulo Guedes (Economia) que prevê salário mínimo e aposentadoria sem correção pela inflação passada. A proposta seria apresentada logo depois do segundo turno em caso de vitória de Jair Bolsonaro (PL). Após a repercussão negativa, o governo mudou o discurso e passou a prometer o reajuste.
O que dizem os presidenciáveis? Após a polêmica provocada pelo projeto de Guedes, Bolsonaro levou o tema para o horário eleitoral gratuito e foi taxativo: "Vamos garantir uma valoração do salário mínimo".
Lula trata o aumento do salário mínimo acima da inflação como uma das bandeiras de sua campanha. "Retomaremos a política de valorização do salário mínimo visando à recuperação do poder de compra de trabalhadores", informa o plano de governo apresentado em junho.
O que é o aumento real? Isso ocorre quando o reajuste oferece um ganho acima da inflação. "Se tenho uma cesta de consumo e os preços sobem com a inflação e o salário sobe exatamente com os preços, o poder de compra não muda", diz o economista Daniel Keller, da consultoria Una Partners. Ao aplicar uma fórmula com resultado maior do que a inflação, o pagamento passa a ter um reajuste "real".
Qual regra fez o valor subir acima da inflação? O salário mínimo obedeceu a uma fórmula entre 2005 e 2018, diz Carla Beni, professora da FGV (Fundação Getulio Vargas). Durante os governos Lula, Dilma Rousseff e Michel Temer, o valor foi corrigido por um cálculo que considerava a inflação do ano anterior mais o crescimento do PIB nos últimos dois anos com uma projeção para o ano seguinte.
Em 2011, Dilma transformou a regra em lei e instituiu uma política de valorização do salário mínimo até 2014. Ela repetiu a iniciativa em 2015 e estendeu a medida até 2019.
O que mudou? Desde 2019, não há mais uma lei atrelando o resultado do PIB à correção do salário. O governo Bolsonaro não elaborou um projeto de lei para substituir a lei anterior, que perdeu a validade. Na época, a avaliação foi de que o reajuste real prejudicaria as contas públicas, e a proposta para o salário mínimo passou a considerar apenas o reajuste pela inflação medida pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor).
Qual o salário mínimo para 2023? O valor previsto é de R$ 1.302 no próximo ano. Na proposta de Orçamento de 2023 encaminhada ao Congresso, não está previsto reajuste acima da inflação. Se confirmado, será o quarto ano seguido sem reajuste acima da inflação. O governo ainda pode propor um novo montante até o fim do ano.
Como bancar uma nova política de valorização do mínimo? Abrir espaço nas contas públicas em 2023 vai ser um desafio para quem vencer a eleição no domingo. Os candidatos ainda não explicaram como vão fazer para conseguir fechar essa conta.
Quais as consequências de um reajuste acima da inflação? A principal justificativa para não conceder aumento real ao salário mínimo é a possibilidade de pressionar as contas públicas por causa do encarecimento dos gastos previdenciários, "uma vez que parte significativa dos beneficiários da Previdência recebe em torno de um salário mínimo", diz Renan Pieri, professor da FGV.
Ele acrescenta que a alta no piso salarial encarece a mão de obra no mercado de trabalho, o que pode provocar aumento do desemprego e da informalidade, e que o reajuste pode provocar inflação. Todos ganham mais, os produtos ficam mais caros porque há mais procura, e a inflação aumenta na sequência.
O lado bom do reajuste: Por outro lado, o aumento real do salário mínimo é apontado por economistas como um dos principais instrumentos para estimular o incremento na renda das famílias. "Foi importante como política de distribuição de renda e gerou benefícios para a classe média baixa nos governos do PT", diz Keller, da Una Partners.
Como reajustes afetam os gastos previdenciários? Segundo cálculos de Simão Silber, professor de economia da USP, o salário mínimo em termos reais aumentou 170% desde 1994.
"Isso pressiona a aposentadoria, tanto no setor público como no privado. Começou a crescer a uma taxa de duas a 2,5 a arrecadação; o governo teve que se endividar e aumentar a carga tributária para enfrentar a despesa", diz.
Qual seria a melhor regra para o salário mínimo? Os economistas afirmam que não há uma regra perfeita. "O salário mínimo é uma referência. Deveríamos estar discutindo o que realmente afeta a produtividade e poderia melhorar o salário das pessoas lá na frente, como educação", diz Bruno Imaizumi, economista da LCA Consultores. "Mas isso demora e não traz retorno no curto prazo."
G1
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