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domingo, 9 de julho de 2023

Texto da Reforma Tributária abre brecha para estados criarem novo imposto


Tributo adicional foi autorizado em PEC aprovada na madrugada desta sexta-feira e beneficia quatro governos estaduais. Para especialistas, mudança contraria princípio do projeto.

Reforma Tributária aprovada em dois turnos na Câmara dos Deputados esta semana abre uma brecha para que estados criem um novo tributo, que se somaria à alíquota padrão do Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Um artigo adicionado à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) permite uma nova contribuição sobre produtos primários e semielaborados para financiar fundos estaduais destinados a obras de infraestrutura e habitação.

“Os Estados e o Distrito Federal poderão instituir contribuição sobre produtos primários e semielaborados, produzidos nos respectivos territórios, para investimento em obras de infraestrutura e habitação, em substituição a contribuição a fundos estaduais, estabelecida como condição à aplicação de diferimento, regime especial ou outro tratamento diferenciado, relacionados com o imposto de que trata o art. 155, II, da Constituição Federal, prevista na respectiva legislação estadual em 30 de abril de 2023.", diz artigo da PEC.

De acordo com o texto, a contribuição poderá vigorar até 31 de dezembro de 2043.

Além disso, estados e municípios terão poder para elevar ou baixar imposto. A alíquota padrão do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), que vai unificar os tributos sobre o consumo, será definida por lei federal, mas após o recolhimento do imposto, essa mesma alíquota será dividida em três partes, uma para cada nível de poder público: União, estado e município.

Essas parcelas correspondentes a cada ente federativo poderão ser alteradas pelas assembleias estaduais e câmaras municipais. Na prática, governados estaduais e prefeituras poderão mexer nas alíquotas para cima ou para baixo.

O relator do projeto na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), disse em discurso no plenário na quinta-feira ter incluído o dispositivo que permite a criação de novos tributos pelos estados a pedido do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), e de outros governadores que têm fundos semelhantes, vinculados à concessão de benefícios fiscais do ICMS.

– Este texto aqui foi um pedido, que foi aquiescido pelos governadores, para atender ao governador Caiado, que fez campanha contra a reforma tributária. Nós estamos atendendo a isso. Ele entendia que é um fundo que já existe no estado de Goiás – disse.

Logo depois, Aguinaldo Ribeiro afirmou que a regra atendia também aos governadores do Pará, Helder Barbalho (MDB), do Mato Grosso, Mauro Mendes (União Brasil), e do Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel (PSDB).

Projeto é 'muleta', diz Caiado

Mesmo com a emenda que atende ao seu estado, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, disse que mantém a posição de ser contra a reforma.

- O que ele (Aguinaldo) propõe é compensar o amputado com uma muleta. Não vou discutir acessório – declarou ao GLOBO.

Ele nega ter conversado sobre o assunto com o relator:

I governador do Pará elogiou a emenda e disse que espera que ela seja aprovada pelo Senado.

- Caso seja mantido entendo ser uma boa oportunidade.

Orocurados, os governadores de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul não retornaram o contato.

Contraria ideia original, diz especialista

Na visão de Luiza Lacerda, sócia da área Tributária do BMA Advogados, a possibilidade de estados poderem criar contribuições sobre produtos primários e semielaborados nos seus territórios vai na contramão do intuito da Reforma Tributária. Segundo a advogada, a medida é prejudicial de dois modos.

Primeiro por conta da não cumulatividade plena porque é uma nova contribuição que vai ser cobrada e vai onerar o produto. E, segundo, porque retira a capacidade do consumidor saber quanto teve de imposto sobre o bem consumido:

Se essa contribuição incide sobre um produto elaborado em quatro estados, como você vai saber o quanto do insumo do caderno que você comprou na papelaria no Rio de Janeiro advém de produtos semielaborados e produzidos no estado de Goiás e tributados com essa contribuição, por exemplo? Isso prejudica por completo a transparência. Foi um lobby feito que não podia ter passado.

Murillo Allevato, sócio do escritório Bichara Advogados, diz que a mudança vai contra o preceito básico do novo sistema tributário que é a simplificação.i

Risco de judicialização

- Chamou atenção a possibilidade de criação de uma contribuição, pelos estados, incidente sobre produtos primários ou semielaborados, para fins de investimento em infraestrutura. Isso é impactante e vai contra toda a ideia da Reforma Tributária, que é reduzir o número de tributos e simplificar o sistema — ressalta o advogado.

Gabriel Quintanilha, professor convidado da Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas , avalia que é possível que o tema seja judicializado: 

É possível questionamento formal porque a emenda aglutinativa não pode criar tributos que não estivessem previstos na redação inicial.

O Globo 

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